Prólogo
Hoje me apareceu por aqui uma mocinha diferente. Magrinha, pequenininha, cheia de sardinhas, o nariz arrebitado. Entrou de fininho como quem não quer incomodar, o queixo enfiado num cachecol cinzento, a testa coberta por uma boina cinzenta – quase que só lhe apareceriam as sardas e o nariz. Um tipo simpático, e dessa opinião compartilha comigo o rapaz que normalmente fica na recepção do hotel, pois fez questão de acompanhá-la até a porta do quarto para garantir ao menos uns quinze minutinhos de conversa com a donzela.
Desde que veio trabalhar aqui, esse moleque eu o vejo uma média de duas a três vezes por ano. Creio que agora verei mais: a garota mora numa cidade da região serrana, mas vem fazer um curso de história da arte aqui no Rio semanalmente.
- É um curso que eu queria fazer há tanto tempo, você nem tem idéia. O único problema é que é de noite, e acaba tão tarde. Sabe como é, fica muito difícil voltar para a minha cidade nesse horário.
E por ser tão difícil voltar para a sua cidade nesse horário, a garota achou por bem dormir uma noite por semana num hotel aqui no Rio.
- Por isso você reservou uma noite por semana até o fim do ano, então?
Sim, a menina achou melhor fazer as reservas, só para garantir.
- Mas o curso vai até metade do ano que vem. Se tudo der certo, mais tarde continuo fazendo a reserva.
Os olhos do moleque juravam à mocinha que tudo daria certo, que ela poderia fazer tantas reservas quanto lhe agradasse.
- Juro que, se você gostar desse quarto, dou um jeito de reservar ele sempre para você.
Ela me examinou do chão ao teto e aprovou suavemente com a cabeça. A situação era fofa até a exaustão, e me deixava feliz a parte que me toca nessa história toda.
O rapaz então me atravessou e abriu a janela.
- Olha só, de longe ainda dá para ver um pouco do mar. Ouvir dizer que dava para ver o mar todo há décadas atrás, antes de fazerem o Aterro.
A garota bem que se esforçava, afiava a vista, franzia as sobrancelhas, e no entanto não via nada além de prédios e árvores, a igreja ao fundo. Daí se virava para o menino delicada, a voz se sumindo dentro do cachecol.
- Um dia eu vejo o mar. Mas gostei desse quarto, obrigada.
Foi aí que o garoto sorriu como quem toma consciência a contragosto de estar bem no meio do serviço, a voz do dono do hotel berrando seu nome lá da recepção.
- Eu tenho que ir... mas esse quarto é sempre seu, sempre que você quiser.
Nisso saiu correndo e deixou a moça sozinha, a porta aberta e os braços finos agarrados nos livros de história da arte. Daí me ocorreu que, além de pequena e simpática, era uma pessoa cheia de idéias sobre a história da arte. Hesitei por um momento: fazia tanto tempo eu não pensava em arte.
A garota também hesitou por uns momentos, até largar os livros sobre a cama para fechar a porta e começar a ter idéias. E eu gostava de idéias, como gostava da parte que me toca.
Desde que veio trabalhar aqui, esse moleque eu o vejo uma média de duas a três vezes por ano. Creio que agora verei mais: a garota mora numa cidade da região serrana, mas vem fazer um curso de história da arte aqui no Rio semanalmente.
- É um curso que eu queria fazer há tanto tempo, você nem tem idéia. O único problema é que é de noite, e acaba tão tarde. Sabe como é, fica muito difícil voltar para a minha cidade nesse horário.
E por ser tão difícil voltar para a sua cidade nesse horário, a garota achou por bem dormir uma noite por semana num hotel aqui no Rio.
- Por isso você reservou uma noite por semana até o fim do ano, então?
Sim, a menina achou melhor fazer as reservas, só para garantir.
- Mas o curso vai até metade do ano que vem. Se tudo der certo, mais tarde continuo fazendo a reserva.
Os olhos do moleque juravam à mocinha que tudo daria certo, que ela poderia fazer tantas reservas quanto lhe agradasse.
- Juro que, se você gostar desse quarto, dou um jeito de reservar ele sempre para você.
Ela me examinou do chão ao teto e aprovou suavemente com a cabeça. A situação era fofa até a exaustão, e me deixava feliz a parte que me toca nessa história toda.
O rapaz então me atravessou e abriu a janela.
- Olha só, de longe ainda dá para ver um pouco do mar. Ouvir dizer que dava para ver o mar todo há décadas atrás, antes de fazerem o Aterro.
A garota bem que se esforçava, afiava a vista, franzia as sobrancelhas, e no entanto não via nada além de prédios e árvores, a igreja ao fundo. Daí se virava para o menino delicada, a voz se sumindo dentro do cachecol.
- Um dia eu vejo o mar. Mas gostei desse quarto, obrigada.
Foi aí que o garoto sorriu como quem toma consciência a contragosto de estar bem no meio do serviço, a voz do dono do hotel berrando seu nome lá da recepção.
- Eu tenho que ir... mas esse quarto é sempre seu, sempre que você quiser.
Nisso saiu correndo e deixou a moça sozinha, a porta aberta e os braços finos agarrados nos livros de história da arte. Daí me ocorreu que, além de pequena e simpática, era uma pessoa cheia de idéias sobre a história da arte. Hesitei por um momento: fazia tanto tempo eu não pensava em arte.
A garota também hesitou por uns momentos, até largar os livros sobre a cama para fechar a porta e começar a ter idéias. E eu gostava de idéias, como gostava da parte que me toca.
3 Comments:
A parte que te toca
Tu sendo a toca dela
Seja donzela ou cadela
É o todo que se aloca.
A parte que te toca
Tu sendo a toca dela
Seja donzela ou cadela
É o todo que se aloca
E é assim que essa louca
Te vê in loco e te loca.
isso aqui tá sempre ótimo!
vai virar livro,,, vai virar filme!
Post a Comment
<< Home